quinta-feira, 30 de junho de 2011

Tema 4 – 2.2 Estratégias centradas nos sistemas

2.2.1- Proposta de intervenção no sistema relacional de Pianta
Pianta (1999), citado em Costa e Matos (2007:86), sugere que compreender “o sistema relacional criança-professor permite a compreensão do sistema relacional na escola” e intervir eficazmente na prevenção e gestão de situações de conflito. Isto é, considerando as componentes primárias da relação professor-aluno – características individuais, representações sobre a relação, processos de troca de informação e influências externas, e as interferências umas nas outras, preconizam uma intervenção no tempo, “tendo em conta as trajectórias desenvolvimentais de todos os elementos que constituem o sistema”, e a promoção do desenvolvimento psicossocial de todos os elementos do sistema, “numa actuação proactiva a diferentes níveis”.
2.2.2- Proposta de Coleman e Deutsch
A proposta de intervenção sistémica no conflito de Colemam e Deutsch, que subentende a escola como um sistema aberto e reconhece a circularidade de influência nos processos inerentes ao conflito, estabelece cinco níveis de abordagem interdependentes: a disciplina, o curriculum, a pedagogia, a cultura escolar e a comunidade.
A proposta de intervenção no sistema disciplina “consiste em programas de mediação entre pares, com formação e supervisão de acompanhamento” e a instituição de centros de mediação.
A intervenção no curriculum prevê a criação de programas de formação no âmbito da gestão de conflitos que incorporem no currículo escolar temas como “compreender o conflito, comunicar, lidar com a fúria, cooperação, assertividade, consciência das diferenças, diversidade cultural, resolução de conflitos e pacificação, variando o seu conteúdo em função das características dos alunos”. (Costa & Matos, 2007:91-92)
Ao nível da pedagogia defendem o uso de duas estratégias de ensino: a “controvérsia nas disciplinas regulares” e a aprendizagem cooperativa, proposta dos irmãos Johnson que assenta em cinco elementos chave, referidos em Costa e Matos (2007:94) -  “interdependência positiva, interacção face a face, responsabilidade individual, competências interpessoais e de pequeno grupo, e processamento ou análise do funcionamento dos grupos de aprendizagem” (reflexão/avaliação).
No âmbito da cultura escolar a intervenção passa por apostar na formação de adultos, nomeadamente no desenvolvimento de competências de negociação colaborativa e na reestruturação do sistema de gestão de conflitos dos adultos.
Por último apontam uma intervenção na comunidade alargada através da criação de parcerias, da instituição de processos colaborativos de resolução construtiva de conflitos.
COSTA, M. E. & MATOS, P. M. (2007). Abordagem Sistémica do conflito. Lisboa: Universidade Aberta.

Tema 4 – 2.1 Estratégias centradas nos indivíduos

2.1.1- Mediação
Pacheco (2006:72), acredita que “a prevenção destes problemas [indisciplina, violência, bullying, os conflitos de um modo geral] passa, portanto, por conseguir implementar um clima favorável ao desenvolvimento de relações interpessoais pacíficas, pela promoção da participação de todos na concepção dos normativos locais e pela capacidade democrática da liderança, percebendo e estabelecendo os limites das obrigações e dos direitos de todos e de cada um”.
Esta autora, como muitos outros estudiosos desta temática, aponta a “Mediação” como uma nova cultura não só de prevenção como de gestão/resolução do conflito, e afirma, citando José Durão Barroso que “a mediação é um processo de resolução dos conflitos segundo o qual, a pedido das partes e dispondo de considerável iniciativa e autonomia, um terceiro procura encontrar a decisão que suscite a adesão dos diferentes litigantes. (…)”. (Pacheco, 2006:138)
A mediação entre pares prevê o treino/formação de alunos para analisar, discutir e gerar acordos em situações de conflitos entre os seus pares. Grave (2004) salienta que “a mediação é um processo que possibilita o desenvolvimento de competências como a escuta mútua, a gestão da agressividade, a cooperação, o sentido de responsabilidade, permitindo, indirectamente, uma valorização das capacidades de cada um, uma tomada de consciência da forma de resolver os próprios conflitos.”
Grave-Resendes, L. (2004). O Direito à educação e a Educação dos Direitos. In Educação e Direitos Humanos. Lisboa: Conselho Nacional de Educação.
PACHECO, F. (2006). A gestão de conflitos na escola. Tese de Mestrado. Lisboa: Universidade Aberta

2.1.2- Integração de programas de gestão de conflitos no curriculum escolar
a) Stevahn (2004), citado em Costa e Matos (2007:82), considera que a integração de programas que permitam a “a discussão dos conflitos nos conteúdos disciplinares” bem como a prática da sua resolução, podem dar bons resultados. O desenvolvimento de atitudes e/ou competências como “a empatia, a justiça, a tolerância, a verdade, a não-violência seja ela verbal, física ou psicológica, o respeito por si e pelos outros e o apreciar a controvérsia como forma de crescimento”, são os propósitos destes programas, e estratégias como a “negociação”, a “mediação” e as “decisões de consenso”, são destacadas por diversos autores, nomeadamente Stevahn (2004), Bodine e Crawford (1998), como as mais eficazes.
b) Heydenberk, Heydenberk e Beiley apresentam, por seu turno, uma proposta de programa a integrar no currículo escolar que privilegia a intervenção dos professores na disseminação de competências de gestão de conflitos nas suas práticas pedagógicas visando o desenvolvimento do raciocínio moral dos alunos. “As estratégias incluem reuniões de turma, centros de resolução de conflitos onde são incentivados o uso de frases na primeira pessoa, estratégias de escuta activa, técnicas de parafrasear, treino de mediação entre pares para alunos, a utilização de vocabulário afectivo, bem como a comunicação positiva em situações de conflito.” (Costa & Matos, 2007:82)
c) Direccionado para “jovens com problemas de comportamento”, a equipa de Moretti, Holland e colaboradores tem desenvolvido programas baseados nos pressupostos da teoria da vinculação. Estes autores consideram que “deverão ser criadas oportunidades de experiências construtivas de proximidade emocional, que permitam a revisão dos modelos e a emergência de novos comportamentos e estratégias de regulação emocional” (Ibidem:83)
Programas como o Response Program, desenvolvido pelos autores imediatamente acima referidos, propõem “uma intervenção sistémica multidimensional”, promovendo o trabalho multidisciplinar com o jovem e a família, a partilha de informação entre as diversas partes envolvidas, a elaboração de “um plano de cuidados”, a definição de estratégias comuns e a constituição de “equipas de rua para trabalhar com grupos da comunidade”. (Ibidem:84)
COSTA, M. E. & MATOS, P. M. (2007). Abordagem Sistémica do conflito. Lisboa: Universidade Aberta.

Tema 4 – 2. Propostas de intervenção no conflito

Para prevenir e gerir conflitos Carmo (2005) considera necessário apostar na educação global dos indivíduos e indica como imperativo operacionalizar quatro vertentes da educação social: “desenvolver inteligência emocional, educar para o carácter, educar para a liderança e educar para a cidadania”.
São muitas as estratégias de prevenção e resolução de conflitos estudadas e testadas por investigadores desta área, quer sejam centradas nos indivíduos quer centradas nos sistemas.
Pessoalmente considero que as propostas de intervenção sistémica no conflito têm maior probabilidade de surtir efeitos, na medida em que cada indivíduo é produto da socialização nos diversos sistemas é que está integrado, logo a acção que contemple intervenções ao nível dos diferentes sistemas, tendencialmente, repercutir-se-á de forma mais consistente.
De seguida apontar-se-á algumas propostas de intervenção no conflito.
CARMO, H. (2005). Indisciplina: como implicar a comunidade?. Encontro sobre o Papel da Comunidade Educativa face à Indisciplina, Golegã, ISCSP/UTL, Universidade Aberta, diapositivos em PowerPoint.

Tema 4 – 1.4 “Bullying”

A fronteira entre violência e bullying, tem sido amplamente discutida por autores da especialidade.
Afonso & Cervino (2006), citados em Urra (2010), definem o bullying “como uma conduta agressiva e persistente no tempo, exercida por um indivíduo ou grupo, que provoca baixa auto-estima, isolamento e exclusão social da vítima. Este tipo de conduta evidencia-se através de insultos, ameaças, intimidação psicológica e agressões físicas, com tendência para aumentar em intensidade e frequência de agressões”.
Urra (2010) acrescenta: “ não é uma agressão esporádica, nem uma brincadeira pontual, nem um conflito entre iguais. Trata-se de um intimador (ou vários) com força física ou poder psicológico que se mete com um jovem mais débil (física ou psicologicamente) – vitima impotente para sair sozinha da situação -, de forma reiterada, sem qualquer razão e sem que ninguém, de entre os que os rodeiam e observam, actue para evitar esta terrível situação”.
O bullying, entendido como expressão extrema de violência, reiterada e dissimulada, requer por parte das Escolas uma vigilância atenta e sistemática, quer por sua vez requer preparação, formação dos alunos e adultos para identificar e lidar com situações desta natureza.
URRA, J. (2010) O pequeno ditador. Da criança mimada ao adolescente agressivo. (16.ª ed.) Lisboa: A esfera dos livros.

Tema 4 – 1.3 Violência

Como refere Pacheco (2006:67), o conceito de violência “está directamente interligado aos conceitos anteriores [conflito e indisciplina], como consequência possível de conflitos graves, decorrentes de eventuais actos de indisciplina”.
Freire et al. (2006), citando Ortega (2003), referem que “a violência é um fenómeno em que há uma constante: algumas pessoas, por si sós, institucionalmente ou em grupo, impedem ou dificultam que outras pessoas tenham livre acesso ao gozo dos direitos humanos, desde os direitos mais básicos, como o direito ao bem-estar físico e à segurança até ao direito à cultura, por exemplo.”
Sebastião (2003:41), caracteriza a violência como “o excesso que, numa relação social, condensa uma visão do mundo como um espaço social de relações conflituais que tendem para uma qualquer forma de ruptura com a normalidade social considerada legítima. É uma relação de poder que, pretendendo ser irreversível, visa a constituição de um estado de dominação; é uma relação em que a coacção é imperativa (…)”.
O sistema Escola, eclético por natureza, é palco de diversas situações de violência, verbal e/ou física, esporádica ou sistemática. Esta é mais uma realidade para a qual é necessário mobilizar conhecimentos, da área da gestão de conflitos, como forma de prevenção ou combate.
FREIRE, I. e al. (2006). O estudo da violência entre pares no 3º Ciclo do ensino básico – um questionário aferido para a população escolar portuguesa. Revista Portuguesa de Educação. 19(2), pp. 157-183
PACHECO, F. (2006). A gestão de conflitos na escola. Tese de Mestrado. Lisboa: Universidade Aberta
SEBASTIÃO, J., et al. (2003). Violência na Escola: das Políticas aos Quotidianos. Sociologia, Problemas e Práticas, nº 41, pp. 37-62. In http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/spp/n41/n41a02.pdf

Tema 4 – 1.2 Indisciplina

Para Charlton e David (1993), referidos em Daniels et al. (1999), falar de indisciplina em contexto escolar é falar de “um conjunto de comportamentos verbais e não verbais que, de diferentes modos e em diferentes graus, desafiam a autoridade do professor ou da escola”. (Aires, 2009)
Na mesma linha de pensamento, Carmo (2005) sintetiza o conceito como “um comportamento de violação de regras que se traduz numa afronta ao poder instituído”.
Amado (2001:417), refere que um comportamento indisciplinado pode “ser ocasional ou persistente, de iniciativa de um indivíduo, de um pequeno grupo, de toda uma turma ou ainda, de um grande número de alunos de uma escola; e que pode ter manifestações variadíssimas que vão da «perturbação do trabalho» às agressões a colegas e professores”. O mesmo autor, (2007:2), advoga que o conceito de indisciplina não deve ser entendido como “um fenómeno redutível ao seu lado aparente, visível, externo (e por isso também descritível e mensurável); esse é o lado externo da transgressão de princípios, regulamentos, contratos e ordens, em discordância com os objectivos do grupo ou instituição e provocando sempre situações de perturbação das relações sociais [...] deve ser entendida como um fenómeno fortemente determinado por dimensões subjectivas da responsabilidade de todos os «actores» em presença”.
Amado & Freire (2002) estratificam as manifestações de indisciplina em três níveis: desvio às regras de trabalho na aula; indisciplina perturbadora das relações entre pares e problemas de relação professor-aluno.
Estrela (2002) salienta que “mesmo que as causas profundas dos comportamentos de indisciplina possam ser de carácter biopsicológico e/ou social, as causas próximas que os fazem desencadear encontram-se em factores existentes nas situações pedagógicas”.
Assim, quer sejam por razões psicodinâmicas, biopsicossociais, sociais, familiares ou behavioristas, conforme Aires (2009), considerando diversos autores nomeadamente Bentham (2005), categoriza as causas da maior parte das manifestações de indisciplina, as situações de indisciplina em contexto escolar não podem ser ignoras, até porque acabam por ser ou derivar para situações de conflito que em ultima análise, como já foi referido, minam o ambiente e comprometem a aprendizagem.
AIRES, L. M (2009). Disciplina na sala de aulas – Um guia de boas práticas. 1.ª ed. Lisboa: Edições Sílabo, Lda.
AMADO, J. (2001). Interacção Pedagógica e Indisciplina na Aula. Porto: Edições Asa.
AMADO, J. & FREIRE, I. (2002). Indisciplia e Violência  na Escola – Compreender para Prevenir. Porto, Edições Asa.
AMADO, J. (2007). Indisciplina e violência escolares: afinal, o que está em causa? Revista Lusófona de Ciências da Mente e do Comportamento – Universidade Lusófona.
CARMO, H. (2005). Indisciplina: como implicar a comunidade?. Encontro sobre o Papel da Comunidade Educativa face à Indisciplina, Golegã, ISCSP/UTL, Universidade Aberta, diapositivos em PowerPoint.
ESTRELA, M. (2002). Relação pedagógica, disciplina e indiscipline na aula. 4.ª ed. Porto: Porto Editora.

Tema 4 – 1.1 Conflito

São muitas as definições de conflito que encontramos na literatura de especialidade e de entre essas inventariam-se algumas:
"Conflito é toda opinião divergente ou maneira diferente de ver ou interpretar algum acontecimento" (Chrispino, 2007)
É um “fenómeno de incompatibilidade entre pessoas ou grupos, e está relacionado tanto com questões estruturais como com as mais pessoais”, “é um fenómeno dinâmico, dialéctico (…), é um processo social que percorre determinado itinerário com subidas e descidas de intensidade, com os seus modos de inflexão”. (Jares, 2002)
"O conflito resulta de uma percepção divergente de interesses, visões ou objectivos (Deutsch, 1973); de preferências opostas (Carnevale & Pruitt, 1992); da crença de que os objectivos actuais das partes envolvidas não podem ser atingidos em simultâneo (Rubin, Pruitt & Kim, 1994); é um processo que começa quando um dos elementos percepciona que o outro frustrou, ou está prestes a frustrar o seu objectivo, preocupação, ideia... (Sanson & Bretherton, 2001)." (Costa & Matos, 2007)
Diversos autores reflectem e apresentam diferentes tipologias de conflitos. Contudo todos, utilizando diferentes nomenclaturas, acabam por os enquadrar nas naturezas de conflitos elencadas por Grave-Resende (2004), “os conflitos podem ser de natureza diversa: interpessoal (entre pessoas), intrapessoal (entre nós próprios), intergrupal (entre dois ou mais grupos que são maioritariamente os tipos de conflitos existentes nas nossas escolas) e intragrupal (dentro do mesmo grupo)”.
Johnson e Johnson (1995) classificam os conflitos escolares em cinco tipologias: “controvérsia” (incompatibilidade de ideias, opiniões…); “conflito conceptual” (percepção divergente/incompatível de determinada informação perante o conhecimento pré-existente); “conflito de interesses” (quando acções de um “interferem ou bloqueiam as acções de outro”); e “conflito desenvolvimental” (“quando forças opostas de estabilidade e mudança co-ocorrem em actividades incompatíveis entre adultos e crianças”). (Costa & Matos, 2007:76)
Independentemente da sua natureza ou tipo, o conflito em contexto escolar existe e em vez de ignorá-lo ou evitá-lo há que aprender a lidar com ele de forma construtiva.
COSTA, M. E. & MATOS, P. M. (2007). Abordagem Sistémica do conflito. Lisboa: Universidade Aberta.
CHRISPINO, a. (2007). Gestão do conflito escolar: da classificação dos conflitos aos modelos de mediação. Ensaio: aval. pol. públ. Educ.. Rio de Janeiro, v.15, n. 54, p. 11-28, Jan./Mar.
Grave-Resendes, L. (2004). O Direito à educação e a Educação dos Direitos. In Educação e Direitos Humanos. Lisboa: Conselho Nacional de Educação.
JARES, X. R. (2002). Educação e Conflito. Guia de Educação para a Convivência, Porto, Edições Asa

Tema 4 – 1. Conflito e intervenção na escola

Actualmente, às escolas é confiada “uma missão de serviço público”, que se traduz na necessidade de promover, para todos os alunos, o desenvolvimento de “competências e conhecimentos que lhes permitam explorar plenamente as suas capacidades, integrar-se activamente na sociedade e dar um contributo para a vida económica, social e cultural do País”. 1
A “Declaração Universal dos Direitos Humanos”2 proclama que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos.
Na escola os alunos constroem o seu futuro. Na escola devem predominar relações de eficácia em face de objectivos e experiências e vivências sociais onde se cruzem valores e normas. Na escola os alunos devem adquirir conhecimentos e desenvolver capacidades necessárias à sua formação integral, enquanto cidadãos conscientes, responsáveis, respeitadores, cidadãos úteis à sociedade.
Os pressupostos em cima referidos são inúmeras vezes postos em causa dada a proliferação de situações de conflito mal geridas em contexto escolar.
Os conflitos escolares minam o ambiente, violam direitos fundamentais e comprometem o processo de ensino e de aprendizagem.

O respeito, a solidariedade, o diálogo, a ternura, a cooperação, a liberdade, a responsabilidade, a tolerância, são alguns dos valores fundamentais a desenvolver e interiorizar pelas comunidades educativas.
Considerando que os conflitos escolares estão associados a actos de indisciplina, violência e “bullying”, importa clarificar estes conceitos.
1 Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de Abril
2 Consultado em http://dre.pt/comum/html/legis/dudh.html